segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Quando menino, achei que meu fascínio pela literatura e meu desejo de ser escritor me levariam pelo caminho da poesia. Lia tudo -- romances, novelas, contos -- mas minhas primeiras tentativas foram dirigidas aos versos, às quadrinhas. Meus ídolos eram Casimiro de Abreu, Gonçalves Dias, Fagundes Varela, Castro Alves. A prosa não me seduzia tanto. Andei pela trilha da poesia por muito tempo, mas o que produzi foi tão insatisfatório -- alguns haicais, meia dúzia de sonetos -- que a certa altura desconfiei daquilo que no início me pareceu incontestável: minha vocação poética. Com o tempo e a frustração, fui me voltando para a prosa -- em especial crônicas e contos -- e hoje é em relação exatamente à prosa que manifesto minha desconfiança: serei mesmo capaz de escrever algo que valha a pena? Da antiga experiência poética restaram poucos textos -- alguns publicados, outros guardados em velhos cadernos. Lembrei-me hoje de dois haicais, que passo a vocês:

PAISAGEM

Silenciosamente
Flutua o cisne: outra lua
No lago dormente.

PRAIA

O vento ao passar
Furtou três folhas, lançou
Três barcos ao mar.

De vez em quando ainda me vem a vontade de me exprimir em versos. Como hoje, por exemplo. Pensando num enamorado que, mesmo tendo se declarado mil e uma vezes à amada, recebe dela a censura de não falar mais com tanto entusiasmo do seu amor, escrevi esta quadrinha:

Já disse tudo. Falar
De novo apenas faria
A flor eterna murchar
E a chama se tornar fria.

Espero falar outras vezes, aqui, de poesia. Porque ela, mesmo quando não aparece declaradamente em um texto, em uma de suas formas tradicionais, é essencial à boa prosa.

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