segunda-feira, 3 de maio de 2010

Pequenas alegrias urbanas (83) -- A saúde

Destroçado por uma desilusão de amor, o homem caminhava pela rua procurando alívio para a alma e o orgulho feridos. Ia pensando em tudo que tinha, na sua empresa, que prosperava sem que ele precisasse sequer ir ao escritório, no seu dinheiro rendendo juros no banco, na sua pouca idade, que lhe permitia ainda esperar muitas alegrias e talvez outra grande ventura amorosa. Pensava nisso tudo e consolava-se por vinte ou trinta passos, mas logo adiante o coração se apertava de novo e chegava a doer. Olhou então para o sol e imaginou quantos homens não se contentariam em estar como ele, andando na tarde tranquila, podendo assobiar, se quisesse, e até cantar, se lhe aprouvesse, e seguir em frente, ou dobrar à esquerda, ou enveredar pela direita, sem compromisso com coisa nenhuma. Lembrou-se do que todos diziam sobre a saúde, sobre o bem supremo que ela representava, e, sentindo-se forte como um cavalo, sorveu voluptuosamente o ar primaveril. Chegou a sorrir. Mas, ao ver no ponto de ônibus um casal de adolescentes abraçado, ele fechou de novo o rosto e disse baixinho, pondo em cada sílaba seu ressentimento: "Que se dane a saúde. Eu quero amor, amor."

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