sexta-feira, 4 de junho de 2010

Pequenas alegrias urbanas (178) -- Romance

Bateu à porta. Tinha se perdido na neve, estava faminto, sedento, morrendo de frio, e não parecia haver outra casa em lugar nenhum, no meio da mais escura de todas as noites. Bateu, bateu mais uma vez, mais uma, e outra. Esperou, esperou, continuou esperando, mas ninguém saiu do conforto da casa iluminada. Sentou-se, desesperançado. A única coisa que podia fazer dignamente agora era morrer ali, para castigar quem se recusava a abrigar um homem perdido, a chamá-lo para o calor da lareira e para a mesa de jantar. Encolheu-se e dormiu um sono que esperava ser o último. A noite avançou, chegou a madrugada e por quatro vezes alguém entreabriu a porta, deu uma espiada nele e não o achou digno de entrar. Ao vir a manhã, ele se surpreendeu por estar vivo, por se encontrar na página 278 de um romance russo e porque, ao contrário dos criados que tinham ido espiá-lo quatro vezes lá fora, a jovem condessa, dona da enorme casa, lhe implorou que entrasse e lhe desse o supremo prazer de tomar café com ela.

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