segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Lírica (1.005) - 2020

O ano é 2020. Muito antes de ele chegar, os numerólogos já haviam se manifestado sobre as calamidades e as venturas contidas nos quatro algarismos. Vaticinaram incêndios pavorosos, altissonantes conquistas esportivas, a aparição de moléstias incuráveis, a surpreendente cura para outras. Nenhum deles revelou que se daria um fato singelo: num dos dias desse ano destinado a tantos espantosos eventos, alguém esvaziaria um quarto numa casa e ali encontraria, num caderno de folhas já esmaecidas por dez outonos, cem poemas nos quais estava toda a arrebatada alma de um homem: versos ruins que, por isso e por não terem sido objeto de nenhum grandioso vaticínio, acabariam lançados a um cesto de lixo do qual, no entanto, antes da chegada do caminhão, um garoto resgataria um objeto pesadíssimo que só em casa lhe diriam ser uma máquina de escrever.

Nenhum comentário:

Postar um comentário