sábado, 21 de janeiro de 2012

O veleiro

Posto no sofá das oito às seis, deixado ali para não atrapalhar quem tem o que fazer na casa, ele fixa os olhos no veleiro da tela. Nas dez horas em que permanece sentado na sala, só o veleiro lhe interessa. Não o atraem as ondas, as gaivotas, as montanhas ao fundo, as nuvens claras. Fita o veleiro e sabe que ele se move, embora lentamente. Às vezes faz cálculos. No último, concluiu que o movimento tem a velocidade de um milímetro por trimestre. É quase nada, porque o veleiro está no centro da tela, cujo comprimento deve ter dois metros. Provavelmente estará morto quando o veleiro conseguir finalmente escapar, mas continua a fazer cálculos. Chegou a pensar na hipótese de um repentino vento impelir o veleiro em um dia de tempestade, mas jamais viu as ondas encapelar-se. Deve contar só com o moroso avanço, tão moroso que nem merece o nome. Sabe que, embora sentado sempre ali, caminha também para a libertação. Gostaria de ser ao menos um pouco mais rápido. Começa a ficar ansioso e, se estivesse no veleiro, saltaria para dentro do mar.

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