segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Alguns dados para a coluna de Falecimentos

Quando me vergasto, sei bem por que o faço. A explicação é simples, e até rima: fracasso. Quando eu morrer, algum piedoso necrológio - talvez daquele jornal que eu amo tanto - usará, para tentar preencher as dez linhas que eu venha a merecer, a informação de que vendi seiscentos mil exemplares, quase todos na área juvenil. E é verdade. Onde, então, está o fracasso? No seguinte: se há algum mérito nisso, será o da generosidade desses leitores que os compraram e o do trabalho de divulgação, especialmente da Editora Ática. Eu sei - e isto me incomoda. Não posso considerar nenhum deles uma obra formalmente acabada. Parece cabotino, tudo isto, e, se tiver alguma importância, que seja a de acentuar o fato de o livro ser um objeto social, que pertence aos leitores mais que ao autor. Os arroubos de ciúme que este tiver em relação a ele, como se fosse um filho muito querido e nunca suficientemente bem compreendido, hão de se dissipar quando o primeiro par de olhos estranho tiver acesso às suas páginas. A partir desse momento, o autor, para usar uma expressão de direito de família, passa a compartilhar a guarda do seu filhote com os leitores. E seus queixumes quanto à possível má interpretação serão impertinentes e até grosseiros. No meu caso, se os leitores vissem meus livros como eu os vejo, eu não teria vendido nem um décimo, tenho certeza. O leitor é um coautor, sempre. Seiscentos mil leitores são seiscentos mil coautores. Que posso fazer mais, além de agradecer?

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